4. A Origem.

 


Quando chega a hora de voltar atrás.

Nesse capítulo dei uma pequena puxada no freio da ação, procurando ajustar alguns pontos e focar no desenvolvimento do personagem principal, começando, inclusive, uma mini arco de origem do Caio.

Espero que goste.

Portanto... Boa leitura!



4. A Origem.   

Natalie pegou o primeiro trem, que a levaria de volta para a Paris de seu tempo, deixando um Caio esgotado, física e espiritualmente para trás.

 Logo seu próprio trem chegou, as portas duplas se abriram, dando passagem para ele e sua Condutora que, mesmo tentando disfarçar, deixava claro estar abalada pela morte das gêmeas.

 ― Eu… ― ele colocou a mão carinhosamente na cabeça da moça, afagando seu cabelo e tirando o chapeuzinho dela para o lado. ― Não vi a pequenina pegando o trem dela…

 ― Ela… ― ainda tentando disfarçar a tristeza, a Condutora se ajeitou enquanto falava. ― Saiu antes de vocês terminarem… Hã… O que vocês estavam fazendo…

 ― Entendi… Bem, Cristal… ― Quase sempre após uma Incursão, Caio sentia o clima entre ele e sua Condutora amainar. ― Mais uma vitória… Uau… O que vem agora?

 ― Ainda não entendi de onde você tirou esse nome…

 ― Ah… Acho que por causa da cor dos seus olhos… Esse azul tão cristalino… Daí como você nunca me diz se tem um nome de verdade… Ficar te chamando de Condutora todo o tempo é meio estranho…

 A garota ficou alguns instantes pensando, considerando as palavras do rapaz, esboçou um esforçado sorriso e então deu espaço para que o rapaz se sentasse num banco, se postando no que ficaria de frente para ele.

 ― O que vem agora, você perguntou? Aguardamos uma nova Incursão…

Em seguida o Trem Cronal se colocou a andar, Caio fechou os olhos, apenas se concentrando no som das rodas de metal em atrito com os trilhos, embalando num necessário sono que, ele sabia, não duraria muito.

 Pouco a pouco o som de vozes foi se aproximando de seus ouvidos e, segundos depois dele ter fechado os olhos no trem do metrô de São Paulo, na linha amarela, com várias pessoas ao seu redor, seguindo até a Estação da Paulista, participado de uma Incursão e vencido, ele finalmente voltava a abri-los no tempo em que ele vivia.

 Caio estava em casa.

Ele desceu seguindo o fluxo dos demais passageiros, quase no automático, saiu da estação e foi até seu apartamento, na rua Bela Cintra,  presente dado por seus pais, após ter entrado na faculdade.

O cansaço aumentava a cada passo, ao chegar diante de sua porta, ele mal conseguia encaixar a chave, tamanho o sono que lhe acometia, algo costumeiro depois de uma Incursão.

Ainda assim ele conseguiu entrar, trancar a porta, tirar toda a roupa e, final e literalmente, desabar na cama.

O sono foi imediato e com ele vieram não apenas sonhos, mas, principalmente, lembranças.

XXX

Cidade de São Paulo, Parque do Ibirapuera.

 ― Tô falando maninho… Tira a porra da cara desses livros e olha ali… tem um mulatinha linda te secando faz tempo…

Caio soltou um suspiro de impaciência, marcou a página que estava lendo e olhou, desinteressado, na direção que Reinaldo, seu melhor amigo, estava indicando com os olhos.

Foi a primeira vez que ele via aqueles olhos azuis, que pareciam brilhar tal qual uma pedra preciosa, deixando-o totalmente sem fôlego e, quando finalmente Caio pensou em se levantar, após tomar um tapa no alto da cabeça, dado por seu amigo, num piscar de olhos, a moça havia desaparecido.

― Mas é um vacilão mesmo… Agora já era...

Durante o resto do dia, e todo o final de semana na verdade, ele simplesmente não conseguiu tirar da cabeça aquela jovem tão singular, de pele quase da cor da noite, em contraste com os cabelos platinados, praticamente brancos, isso sem contar os olhos hipnotizantes.

A semana de provas ajudou a tirar da cabeça de Caio a imagem daquela moça, ainda que, em alguns pesadelos, ele a via. Às vezes estendendo a mão conforme ele caia em um mar de trevas, já em outras ela o amparava, após ser ferido por algo que ele não conseguia ver.

Em sonhos ele acabava conhecendo-a de forma mais íntima.

De qualquer maneira ele sempre acordava tão suado que precisava de uma ducha fria, para se refrescar ou mesmo para acalmar a animação com os sonhos mais explícitos.

Ainda assim sua vida seguia o rumo acelerado de estudante de medicina, deixando a impressão da “Garota do Parque”, como Reinaldo passou a chamá-la, reservada apenas para o mundo onírico, ou relegando-a a uma impressão de ver sua imagem com o canto dos olhos, no meio da rua ou em outros lugares.

― Tô te falando Caio… Esse novo barzinho que descobri é muito foda… Todo mundo fala das minas que vão lá!

― Reinaldo, acho que tu veio do interior só pra caçar mulher, em vez de levar a sério o estudo… Você quer virar médico ou não?

― Ué… E pra ser médico eu tenho que deixar de curtir mulher? Não vou ser padre, nem monge… Tu que leva a sério demais… Por isso ficou travado na Garota do Parque…

Aguentando as gargalhadas exageradas do amigo de infância, Caio apenas meneou negativamente a cabeça e aguardou o trem do metrô que os levaria até o tal bar.

Assim que as portas duplas se fecharam Caio arregalou os olhos.

Do lado de fora lá estava a misteriosa garota, mas agora ela usava um estranho uniforme, parecia as roupas que algumas amigas de Reinaldo, que ele havia lhe apresentado durante um evento cosplay no bairro da Liberdade.

Aqueles olhos que pareciam uma piscina, onde ele podia se afogar, estavam fixos nele, como que despindo sua alma.

O trem começou a se mexer e, sentindo a velocidade de sua pulsação aumentando, ele conseguiu um banco vazio, sentando rapidamente e procurando recuperar o fôlego.

― Eita cara! Cê tá bem? Caralho, parece que viu um fantasma...

― Eu… Eu... ― até falar parecia extremamente difícil. ― Dá um tempinho…

Caio reclinou o corpo para trás, encostando o topo da cabeça no vidro frio de uma das janelas do vagão, pousou as costas de sua mão direita diante dos olhos, fechando-os conforme tentava recuperar o controle.

Um tempo indeterminado se passou até o rapaz perceber o estranho silêncio ao seu redor, não apenas Reinaldo havia parado de falar, mas também não conseguia ouvir os típicos sons de um trem do metrô quase cheio.

Assim que abriu os olhos ficou estarrecido.

O vagão estava totalmente diferente, parecia de algum outro país que não fosse o Brasil, sem nenhuma propaganda, nem nas paredes ou mesmo passando nos típicos monitores, esses só mostravam estática.

 Ele nem lembrava mais como era uma tela de estática, substituídas, nos dias atuais por telas azuis.

Tudo ali dentro só apresentava as cores preto e branco, um design futurista, pelas janelas a escuridão era total, não era possível ver nenhuma das luzes amarelas de manutenção dos túneis.

Mas nada disso deixou Caio tão surpreso quanto ao fato de que apenas mais uma pessoa estava naquele vagão, a mesma garota que ele vira no parque e que nunca mais havia saído de sua cabeça.

― Bem vindo Caio de Assis… Pode me chamar de Condutora e vou te levar ao seu… Destino.

― Como é que é?

Sem nenhum aviso a garota cobriu a distância entre eles e colocou gentilmente sua mão direita sobre o peito do rapaz, logo na área acima do coração.

― Acredite… Eu sinto muito.

No instante seguinte Caio berrou a plenos pulmões, quando uma dor excruciante veio do local onde a Condutora havia colocado a mão, fazendo com que ele se desvencilhasse dela em desespero, tirando a camiseta para ver o que havia ali que pudesse lhe causar tanta dor.

Ainda com as bordas vermelhas, dando a impressão de sua pele ter sido marcada como a de um boi, estava uma tatuagem negra, na forma de uma cruz estilizada, com pontas iguais às de uma flecha, com setas menores saindo do centro dela.

Pareciam com ponteiros de um relógio.

 

 Continua.


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2 Comentários

  1. Um episódio esclarecedor, voltando ao inicio da jornada de Caio.

    A transposição dimensional-temporal do metrô normal para o trem cronal ficou muito bem descrita, dando a exata sensação que o personagem sentiu.

    Num abrir e fechar de olhos, todo o cenário muda.

    Novamente, dois anis depois, meus parabéns!

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    1. Muito obrigado pela leitura e comentário.
      Eu curti ir experimentando narrativas e descrições nesse título.
      Me ajudou bastante a evoluir minha escrita

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